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Práticas Colaborativas: uma mudança de olhar




No Brasil, até 1977 o vínculo jurídico do casamento era indissolúvel. Ou seja, o casamento não podia ser desfeito. Somente quando a convivência do casal já estava insustentável o “desquite” era permitido e, ainda assim, apenas nos casos previstos em lei.


O desquite apenas interrompia os deveres conjugais. Os bens eram partilhados, a convivência do casal era encerrada, mas o recasamento não era permitido.


A partir de 1977, com a Lei do Divórcio, as pessoas puderam voltar a se casar após a separação e assim terem a nova união cercada da proteção jurídica do casamento. Mas o recasamento era permitido apenas uma vez.


Foi apenas após a Constituição Federal de 1988 que múltiplos divórcios passaram a ser legalmente aceitos no Brasil.


Como herança de uma tradição secular de união entre Estado e Igreja, a instituição casamento sempre carregou, no Brasil, o peso de que a unidade familiar deveria permanecer intocada.


Até hoje sentimos os efeitos deste pensamento. Não é, portanto, de se estranhar que ainda nos dias de hoje o fim do casamento carregue o estigma do fracasso e que seja motivo de muita angústia, culpa e até de isolamento social, especialmente entre as mulheres.


No entanto, é motivo para celebrar o fato de termos avançado na conquista de direitos quando o assunto é a dissolução da sociedade conjugal.


O direito ao divórcio deve ser visto como uma conquista social, um passo importante na direção do reconhecimento de que tanto homens quanto mulheres estão livres para recomeçar a vida em outros termos, seja sozinhos, seja em novas configurações familiares.


Mas a solução jurídica não é suficiente para dar conta dos aspectos subjetivos e mais sutis que cercam o fim do casamento. Este é um momento de luto, de tristeza, de alta carga emocional e de enfrentamento de obstáculos que à primeira vista podem parecer intransponíveis.


Não raro, justamente quando precisamos juntar forças para encarar uma montanha de desafios, estamos fragilizados, vivendo e sendo a pior versão de nós mesmos.


Felizmente, uma nova perspectiva sobre o divórcio vem sendo trabalhada entre os profissionais que atuam nessa linha de frente, especialmente advogados, mas não apenas.


São as Práticas Colaborativas.


Práticas Colaborativas são um método não adversarial de resolução de conflitos, onde os profissionais e seus clientes se comprometem, pela assinatura de um termo de participação, a prezarem pela transparência e pela colaboração nas negociações, trabalhando em convergência na construção de acordos que beneficiem a todos os envolvidos no conflito.[1]


Um aspecto fundamental desta prática é a colaboração entre os advogados, que se comprometem formalmente a não levarem o caso a litígio.


Caso este venha a ser necessário, outros advogados terão de ser contratados pelas partes.

Outra característica muito importante é a presença de profissionais de saúde mental que irão acompanhar os clientes durante este processo.


O amparo à subjetividade das pessoas fica garantido, e os aspectos que muitas vezes conduzem os cônjuges para caminhos belicosos e destrutivos, como medo, raiva, frustração, ansiedade, angústia, ganham espaço para serem cuidados e não ignorados.


Agregar ao pacote que é oferecido aos clientes no momento do divórcio não apenas a ajuda jurídica, mas o acesso a profissionais de saúde mental - e por vezes profissionais de outras áreas, como a financeira - é fundamental para a construção de um caminho mais saudável e menos traumático para todos.


Está na hora de mudarmos a narrativa sobre o que é e como pode ser o final de um casamento. Mudar a chave de um pensamento de devastação emocional, financeira e social, para enxergarmos este momento como o fim de um ciclo e início de um novo, mais feliz e frutífero, construído sobre terreno fértil, não mais sobre uma terra arrasada.

Claro que nos casamos para sermos felizes.


E nos separamos para sermos felizes também.


Bia Carvalho

[1] Para mais informações, visite o site do Instituto Brasileiro de Práticas Colaborativas https://praticascolaborativas.com.br/quem-somos-2/

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