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Viver ou Debater?




Há alguns anos, acompanhava uma novela chamada “Que Rei Sou Eu?".

No enredo, a rainha Valentina, interpretada pela fantástica atriz Tereza Raquel, deveria assumir o governo de Avilan e era mostrada como uma líder despreparada e totalmente influenciada por seus “assessores”.


Toda a trama mostrava a procura pelo filho bastardo do pai de Valentina, pois ele seria o “legítimo”, pelo único motivo dele ser um homem. Até chegam a coroar, como rei, um “mendigo improvisado” para assumir o trono: tudo isso só e simplesmente por buscarem um... homem.


Mas, o que me chamou atenção nessa telenovela em plena década de oitenta nem foi o seu enredo. Mas, o título.


Tudo porque “Que Rei Sou Eu?” é uma questão de muito mais filosófica do que um mero questionamento de ocasião.


Naquela época, havia um debate que girava em torno das “obrigações” sociais entre homens e mulheres. Esse era o mote do título da novela. A conquista de espaços pessoais e profissionais se resumiam a dois gêneros. Não que os outros não existissem. Apenas, ainda não tinham oportunidade para se se manifestarem.


Quase três décadas depois e uma mudança de século, os papéis sociais mudaram. Evoluíram. E muito. Diria que até para melhor. Minorias conquistaram espaços e cada um pôde assumir o que é ou o que pretende ser.


Mas, a questão que fica para mim, ainda não encontrei a resposta: afinal, essa luta vale a pena em que sentido? Ou, uma vez conquistado o terreno e o direito de fala, o que faremos para que cada um possa viver?


E “viver”, aqui, no sentido mais estrito do termo: apenas tentar ser feliz sem tentar transformar a própria felicidade em bandeira social?


Óbvio que as bandeiras sociais são fundamentais. Sem elas, pararíamos no tempo.


Mas, todo argumento socializado implica em obrigações: satisfação ao outro. Oferecer ao próximo a oportunidade de usufruir do mesmo direito.


E em muitas oportunidades quando leio as redes sociais, jornais (sim, eu ainda faço isso), assisto à chats e seus respectivos cortes, percebo que a luta não mudou.


Todos ainda lutam para conquistar os seus direitos e espaços. Muitos ainda veem o gênero oposto como inimigo.


E, todos, sem exceção, estão perdidos. Sem tempo, inclusive, para tentarem aproveitar o que já foi conquistado.


Buscam o espaço social, o “superar” o medo, a controlar a ansiedade, a tentar encontrar o clitóris, a saber como dar prazer ao parceiro e parceira, o direito ao prazer, o direito de existir, ou de ser quem optou ser e, por aí, vai...


Uma vez, conversando com minha mãe, que viveu uma época em que as mulheres quase não tinham direito algum, ouvi dela um relato emocionante.


Ela era bailarina e um dia comentou comigo sobre os bailarinos e bailarinas com quem teria “ficado”.


Quando questionei o porquê disso em plena guerra, na Europa, ela me respondeu: - “Filho, estávamos em guerra. Não sabíamos nem se o espetáculo e/ou nossas vidas seriam interrompidos, a qualquer momento, por uma bomba. Dançávamos no palco e vivíamos o que nos restava, fora dele. Não tínhamos tempo para debater. Queríamos só amar e tentar ter momentos felizes. Ser homem, mulher ou até mesmo debater valores sociais não tinha a nenhuma importância, naquelas circunstâncias. Só não queríamos morrer sem ter tentado tudo que era possível experimentar e sem ter vivido todas as experiencias possíveis. A sua geração debate muito e vive pouco. Falta equilíbrio”.


Pois é, como nos ensina a música de Ângela Ro Ro: “Só nos resta viver”. Ou, vocês preferem só debater?


Roberto Halfin



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