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Quem é você no Carnaval?





No raiar do sol de um sábado de Carnaval, um senhor sai da garagem para viajar com a família e se choca de frente com um carro que entrou em alta velocidade, na contramão , numa determinada rua de Salvador.


O condutor infrator, saltou do veículo e se dirigiu ao senhor,  que ainda no volante tentava se recompor do susto, e foi logo perguntando desaforadamente:  


- Está cego? Não me viu, não? 


O senhor, responde calmamente:


- Desculpe não esperava encontrá-lo na contramão e ainda por cima correndo desse jeito.


- Estou com pressa, estou fazendo o Carnaval - disse o motorista imprudente.


- Compreendo que tenha pressa, mas sua direção perigosa poderia ter causado danos irreversíveis ao senhor, à mim, à  minha família, inclusive porque o senhor  tem sinais visíveis de embriaguez - mais uma vez, sem se exaltar, ponderou o atingido.


- Ora, você sabe com quem está falando? Sou Fulano .., primo de Cicrana, cantora do Bloco X . Faço a produção de tudo e sem mim o Carnaval não acontece! Como é seu nome?


- Zé - responde o senhor


- E quem é você  no Carnaval, Zé  ? 


Zé não responde nada e retorna a casa com o veículo batido.


Preciso dizer que prestava uma assistência jurídica astral para o Bloco - ou seja sem dinheiro - e com promessa de ser recompensada por uma ótima energia.


Ainda que se tratava de um pequeno Bloco estreante, sem qualquer patrocínio nem perspectivas de futuro, cuja cantora - complemente desconhecida e dona do veículo que abalroou o de Zé, por não não saber conduzir entregava a direção a um primo extraordinariamente sem noção, o qual, no Carnaval além de arrumar confusão, não fazia mais nada.


A amiga que me pediu para fazer a caridade da advocacia pro bono ou seja grátis, ligou para mim após o ocorrido pedindo minha interseção para reparação dos prejuízos causados a Zé, de quem sua irmã, coincidentemente, era  assessora, porque Zé era um desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia!!!

 

Então, após o Carnaval, estive com o sr. Zé para ressarcir os prejuízos e inclusive ,em nome do Bloco, pedir desculpas pelo dissabor, quando ouvi dele: 


- Dra, o pior susto que tomei não foi com a batida, mas o da pergunta a qual me desafiou durante todos dias da festa, melhor dizendo: - Quem é você no Carnaval ???  Acredite que durante toda a minha vida, inclusive enquanto folião que fui nunca me dei o trabalho de me fazer este questionamento? - Disse-me sorrindo e completou: - No Carnaval sou apenas um dissidente.


Passaram-se muito anos do ocorrido e até hoje, ao contrário do Desembargador, sigo me perguntando, sobre  "Quem sou eu no Carnaval?"



Claudia Lacerda

 

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