top of page

A onça e a presa



- Alô! Alôô! Alôôô!


O telefone do quarto tocava incessantemente e as batidas do meu coração faziam jus ao ritmo musical que consagra essa maravilhosa cidade. É exatamente assim que acordo naquela manhã ensolarada, em plena segunda-feira, no Rio de Janeiro.


- Senhor, seu telefone toca desde às 6 horas da manhã conforme seu pedido à recepção e estamos preocupados com a sua integridade - Calmamente disserta o atendente daquele agradável hotel.


- E que horas são? Pergunto ainda assustado e com o coração registrando algo acima dos 160 batimentos por minuto, como a bateria de uma escola de samba em pleno desfile de carnaval.


- São 10 horas. O Senhor precisa de algo? - Gentilmente pergunta o atendente.


- Não, obrigado!


Levanto-me ainda assustado, olho pela janela, por dentre as cortinas artesanais de tear e avisto, de um ângulo privilegiado, toda a deslumbrante natureza daquele morro. Estou no bairro de Santa Tereza e pouco me lembro da noite anterior.


A água do chuveiro começa refrescar meu corpo e logo minha mente entra num estado de tranquilidade, permitindo que alguns flashes apareçam a cada piscar de olhos.


Ontem, estava no centro da cidade, escolhendo alguns livros na charmosíssima Livraria da Travessa. Lembro ter pedido a minha focaccia de sempre – a Parma - tomei meu café e saí para uma caminhada.


Mais água cai sobre o meu corpo, dessa vez com a espuma do sabonete líquido à base de capim-limão que compõe a lista de amenities do Santa Teresa Hotel.


Agora, lembro estar atravessando o Arco do Teles, por debaixo do seu histórico forro de madeira e piso em paralelepípedo. Ouço uma risada feminina e me arrepio inteiro. Olho para um lado, olho para o outro e nada.


Cadê a mulher?


Continuo caminhando e as ruas estreitas após o arco estão vazias, o comércio fechado, mas o ruído dos bares se aproxima. Novamente ouço a tal risada feminina e, dessa vez, acompanhada por uma onda de calor que vinha por trás de mim.


Sinto minhas pernas bambas, batimentos cardíacos acelerados e um calafrio intenso.


- É melhor desligar o chuveiro! Falo num tom de voz acima do normal, principalmente levando em consideração o fato de estar sozinho naquele banheiro.


A livraria, as comidinhas, o arco, o forro, o piso, o comércio, eram elementos muito claros na minha memória. E a risada? O que aconteceu depois?


Faço um esforço em vão para tentar lembrar mais alguma coisa e resolvo acelerar meu ritmo, afinal o dia estava repleto de reuniões agendadas.


Consegui me reunir com meus clientes num almoço na Barra da Tijuca, as reuniões fluíram muito bem e, realizado profissionalmente, retorno ao hotel.


Ao banho, a memória olfativa vem à tona e o perfume do capim-limão me faz lembrar do que passei naquela manhã. Dessa vez, sem me preocupar tanto, me vesti e desci para jantar no agradabilíssimo Térèze.


A luz baixa, a trilha sonora passando por clássicos como Bola Sete, Sivuca e Hermeto Pascoal, os janelões de vidro e as cúpulas vermelhas das luminárias situadas sobre as mesas saltam aos meus olhos e as lembranças acendem dentro de mim.


- Prazer, Bárbara! Ouço dentro de mim a voz daquela atraente e charmosa mulher.


Sim! Bárbara era o nome dela! Era ela quem ria no Arco do Teles e que, após uma sedutora troca de olhares, elogios mútuos, acompanhados de alguns drinks, subiu comigo para o morro e nos sentamos nessa mesma mesa que agora janto solitariamente.


- Que tal um rosè? - Pergunta ela para mim.


Nossa, me pegou de surpresa! Achei uma atitude “empoderada”. Ela sugeriu o vinho ideal para aquela noite quente e, na sequência, lembro de um convite ainda mais surpreendente:


- Que tal abrir essa garrafa no seu quarto? - Fitando meus olhos, ela separa discretamente os lábios e coloca sua mão sobre meu antebraço.


Entramos no quarto e, automaticamente, levo minha mão para o interruptor de luz.


Imediatamente, ela apaga a luz e no meu ouvido sussurra:


- Deixe a luz da lua cheia iluminar a nossa noite de prazer!


Estava experimentando o real estado de flow, com total consciência do que estava fazendo, sentindo muito prazer por estar ali com ela, mas pouco consigo me lembrar nesse exato momento.


O corpo dela era quente, uma mulher forte e experiente. Eu me sentia uma presa, mas estava curtindo cada segundo daquela noite.


Começamos a nos beijar ardentemente e fomos tomar uma ducha, como num andar sincronizado, sem descolar nossos lábios e corpos.


Debaixo d’água, a temperatura aumento e era misto de amor com sexo selvagem.


Selvagem?


- Bárbara? Cadê você?


Vinho sugerido: Villa Francioni VF Rosè


Fernando Palauso

bottom of page