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COISAS DA VIDA



 

Meu filho e eu sempre mantivemos uma relação muito boa.


As idas aos jogos de futebol, os sanduíches “dos meninos”, as caminhadas sem rumo pela Avenida Paulista, os passeios de bicicleta, as idas ao shopping, contribuíram para a formação de um ambiente onde as confissões eram feitas de forma plena e segura entre nós.


Foram esses os momentos que nos uniram e tornaram a relação “pai e filho” algo bastante sólido.


Durante o período da adolescência, o que não foi uma surpresa para a mãe e o pai, houve um certo distanciamento nessa relação. E, no início da fase adulta, por alguns anos - uma vez que ele deixou o Brasil para estudar no exterior - esse distanciamento físico se intensificou.


Em uma tarde ensolarada da capital paulista, após uma video chamada com o nosso filho, descemos para tomar um café com um casal de amigos.


Era domingo e fomos conhecer o Mug Casarão Braúna, que fica na Pamplona.  O local é incrível, a atmosfera é especial e o café delicioso. Após algumas xícaras e bolos servidos sobre a mesa, deixamos a cafeteria e nossos amigos. O tempo havia passado de forma leve e gostosa.


Eu me sentia revigorado, feliz e, ao mesmo tempo, ansioso porque havíamos conversado com o nosso filho e ele dizia que estaria no Brasil em uma semana, mas sem precisar a data, como de costume.


Caminhando rumo ao Reserva Cultural, nosso cinema favorito nos finais de tarde de domingo e um “templo de salvação” para quem quer fugir das produções comerciais que inundam as salas dos cinemas de shoppings Brasil afora, eis que meu coração disparou.


Era uma tensão, uma emoção, um nervoso, uma alegria, todos os sentimentos misturados e que surgiram sem me avisar: meu filho, com uma sacola na mão, vindo na nossa direção!


Emocionado, abracei aquele “homem” que não via há mais de um ano e ambos se viram em lágrimas, enquanto compartilhávamos memórias em nossas mentes, justamente naquele local que, por vezes, foi palco da nossa história.


Foi como se o acaso tivesse decidido por nós e isso é muito difícil para mim. Seja por conta das minhas crenças, do meu signo, enfim, tenho dificuldades de aceitar o acaso.


A mãe também o abraçou e logo perguntou:


- O que você faz aqui, já que falamos há pouco e você disse que só estaria conosco na próxima semana?


Ele, sorrindo e com um ar debochado, respondeu:


- São Paulo é tão pequena que nem consegui fazer uma surpresa para vocês. Estava escolhendo um presente para levar e, como sempre, vocês estão na “minha cola”.


Rimos!


Juntos, caminhamos alguns metros, passamos em frente ao cinema e não entramos para a seção das 18h00, ainda que os ingressos haviam sido comprados com antecedência.


Em um momento único e mágico, de carinho e reconexão, lembrei de um trecho de uma das obras mais significativas de Guimarães Rosa: "O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem."


E assim, seguimos os três para casa, com o coração quente, o sossego necessário para ouvir as histórias dele e, acima de tudo, repletos de coragem para saber que o acaso foi um presente para nós, mas que brevemente teríamos que nos afastar novamente.


A síndrome do ninho vazio também “pega” os homens e é preciso saber lidar com o desconforto emocional quando vemos os nossos filhos deixando a casa.

 

Música sugerida: When you need me, Bruce Springsteen

Vinho sugerido: Columbia Crest Grand Estates Chardonnay


Fernando Palauso

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